Esse foi o segundo post, logo após a abertura desse espaço. Agora com o meu namoro com o MediaFire (hospedagem de arquivos), faço a "re-postagem" desta feita com um link que vai possibilitar o download de uma coletânea da Mariza... é só clicar aqui
Diva
Diva
Lá se vão alguns anos desde a primeira vez que a vi e ouvi... Estava zapeando os canais por assinatura quando me deparo com um festival de fados na RTPI (TV portuguesa). Adoro fado, bom que se diga. Gosto da atmosfera melancólica do estilo. Sou daqueles que se arrepiam ouvindo a Amalia Rodrigues.
Pois bem. Quando a vi confesso que me chamou atenção sua "estampa". Alta, cabelos descoloridos e curtos em um arranjo meio futurista a emoldurar um rosto marcado por um certo prognatismo...
E então, a voz...
Ela ataca logo "Povo Que Lavas no Rio"...
Pelas velas e caravelas de Cabral, foi um vendaval. Tinha me acostumado aos trinados delicados de Dulce Pontes. Já me dera com a modernidade com que a Dulce vestia sua música. Mas ali, desfilava o espírito e o desenho original do fado... Era o mesmo poder da Amália que se derramava ao meus ouvidos... Era a própria boêmia Alfama (essa Montmarte lisboeta???) que me tomava a sala e o juízo.
Pronto. Só foi aquela vez. Da Mariza, não consegui achar nada. Fiquei com o gostinho de uma música só.
Os tempos correm e agora a Net mostra mais claramente suas muitas possibilidades. Nesses dias, buscando novas sonoridades para abastecer o player de mp3 - meu inseparável parceiro de caminhadas diárias - lembro da diva e saio em busca de algo. Localizo e de imediato desço seus 3 CDs. Logo depois consigo o show "Mariza - Ao vivo em Londres". É simplesmente AVASSALADORA A PERFORMANCE DA FADISTA nesta audição. A Dulce Pontes que me perdoe, mas quero o divórcio. Mariza não se rende às novas vestimentas sonoras... Mariza pinça cada pedaço de desgosto, cada farpinha de tristeza, cada lasquinha de mágoa e com eles emoldura sua voz. É uma voz poderosa. Sobe aos agudos e lá fica não de forma cristalina, nos moldes da Dulce. Quando sai da região mais baixa do seu espectro vocal a Mariza leva junto a aspereza sombria e tensa do seu grave... Nada de cristais... Fica mais pra uma " ...vidraça, enegrecida e quebrada..." Pudera: a menina cantava ... Soul?!?!?!?!?!
"...Uma mulher a cantar
O seu fado de amargura.
E através da vidraça
Enegrecida e quebrada
Aquela voz magoada
Entristece quem lá passa..."
(Vielas de Alfama)
E o set list? O que dizer de quem canta Fernando Pessoa, Florbela Espanca e David Mourão-Ferreira?
"...Do vale à montanha
Da montanha ao monte
Cavalo de sombra
Cavaleiro monge
Por plainos desertos
Sem ter horizontes
Caminhais libertos...
Do vale à montanha
Da montanha ao monte
Cavalo de sombra
Cavaleiro monge
Por quanto é sem fim
Sem ninguém que o conte
Caminhais em mim."
(Cavaleiro Monge - Fernando Pessoa)
“...Tanto tenho aprendido e não sei nada.
E as torres de marfim que construí
Em trágica loucura as destrui
Por minhas próprias mãos de malfadada!
Se eu sempre fui assim, este mar morto:
Mar sem marés, sem vagas e sem porto
Onde velas de sonhos se rasgaram!...
Caravelas doiradas a bailar...
Ai quem me dera as que eu deitei ao mar!
As que eu lancei a vida, e não voltaram!...”
(Caravelas / Florbela Espanca)
“...Todo o amor que nos prendera
Como se fora de cera
Se quebrava e desfazia
Ai, funesta primavera
Quem me dera, quem nos dera
Ter morrido nesse dia ...
Todo o amor que nos prendera
Se quebrara e desfizera
Em pavor se convertia
Ninguém fale em primavera
Quem me dera, quem nos dera
Ter morrido nesse dia...”
(Primavera / David Mourão-Ferreira)
Agora imagine esses versos soberbamente cantados por uma moça alta, do pescoço para baixo vestida à moda fadista com o mais tradicional vestido longo e xale negro. Do pescoço para cima um rosto que mais se imagina encontrar em uma rave ou em um festival techno... Dulce Pontes, fique com raiva não Neguinha, mas decisivamente quero o divórcio... Todas as peripécias eletrônicas COMPETETEMENTE (sejamos justos) inseridas no trabalho da Dulce Pontes, se apagam diante do poder acústico do trio que acompanha a Mariza. Um violão que, não bastasse a beleza da base do fado, ainda faz uma ou outra linha flamenca.Um baixolão super discreto background para uma guitarra lusitana BELISSIMAMENTE INDISCRETA a despejar trinados encaixados em tristes acordes menores. Amigo e amiga, creia-me: o prêmio da BBC foi pouco.
O fim do show “Mariza - Ao Vivo em Londres”... Depois de ver a diva quase chorar (e fazer chorar) interpretando “Primavera” (que ela, mastigando um inglês de banco-de-escola, diz ser seu fado predileto), nada se espera do restante do show simplesmente por acreditar não ser possível fazer nada melhor... O que poderia superar aquilo que desfilou ante olhos e ouvidos???? Então, ela se dirige ao publico... Vai encerrar o show com o mais tradicional dos fados. Vai cantar aquele que (palavras dela) mais traduz a “alma do povo português”:::: “Povo Que Lavas no Rio”... Pronto... Para mim só faltavam “as tábuas do meu caixão” se me permite Homero Homem o empréstimo desse pedacinho de “Povo Que Lavas no Rio”... E, segue a fadista, vai interpreta-lo da forma como se faz originalmente nas tabernas: ACÚSTICO, SEM MICROFONE.... Ela desce do palco e se dirige ao meio do público. Seu trio de apoio (violão, baixolão e guitarra lusitana) a segue. Se posicionam bem no centro do recinto, ali, na platéia. Tudinho desligado...Nada ploogado... Nada de fios e tomadas... Nada de efeitos...
E então, ainda soando os acordes introdutórios, emerge a voz grave, melancólica, sombria...
“Povo que lavas no rio
que talhas com teu machado
as tábuas do meu caixão..."
Pois bem. Quando a vi confesso que me chamou atenção sua "estampa". Alta, cabelos descoloridos e curtos em um arranjo meio futurista a emoldurar um rosto marcado por um certo prognatismo...
E então, a voz...
Ela ataca logo "Povo Que Lavas no Rio"...
Pelas velas e caravelas de Cabral, foi um vendaval. Tinha me acostumado aos trinados delicados de Dulce Pontes. Já me dera com a modernidade com que a Dulce vestia sua música. Mas ali, desfilava o espírito e o desenho original do fado... Era o mesmo poder da Amália que se derramava ao meus ouvidos... Era a própria boêmia Alfama (essa Montmarte lisboeta???) que me tomava a sala e o juízo.
Pronto. Só foi aquela vez. Da Mariza, não consegui achar nada. Fiquei com o gostinho de uma música só.
Os tempos correm e agora a Net mostra mais claramente suas muitas possibilidades. Nesses dias, buscando novas sonoridades para abastecer o player de mp3 - meu inseparável parceiro de caminhadas diárias - lembro da diva e saio em busca de algo. Localizo e de imediato desço seus 3 CDs. Logo depois consigo o show "Mariza - Ao vivo em Londres". É simplesmente AVASSALADORA A PERFORMANCE DA FADISTA nesta audição. A Dulce Pontes que me perdoe, mas quero o divórcio. Mariza não se rende às novas vestimentas sonoras... Mariza pinça cada pedaço de desgosto, cada farpinha de tristeza, cada lasquinha de mágoa e com eles emoldura sua voz. É uma voz poderosa. Sobe aos agudos e lá fica não de forma cristalina, nos moldes da Dulce. Quando sai da região mais baixa do seu espectro vocal a Mariza leva junto a aspereza sombria e tensa do seu grave... Nada de cristais... Fica mais pra uma " ...vidraça, enegrecida e quebrada..." Pudera: a menina cantava ... Soul?!?!?!?!?!
"...Uma mulher a cantar
O seu fado de amargura.
E através da vidraça
Enegrecida e quebrada
Aquela voz magoada
Entristece quem lá passa..."
(Vielas de Alfama)
E o set list? O que dizer de quem canta Fernando Pessoa, Florbela Espanca e David Mourão-Ferreira?
"...Do vale à montanha
Da montanha ao monte
Cavalo de sombra
Cavaleiro monge
Por plainos desertos
Sem ter horizontes
Caminhais libertos...
Do vale à montanha
Da montanha ao monte
Cavalo de sombra
Cavaleiro monge
Por quanto é sem fim
Sem ninguém que o conte
Caminhais em mim."
(Cavaleiro Monge - Fernando Pessoa)
“...Tanto tenho aprendido e não sei nada.
E as torres de marfim que construí
Em trágica loucura as destrui
Por minhas próprias mãos de malfadada!
Se eu sempre fui assim, este mar morto:
Mar sem marés, sem vagas e sem porto
Onde velas de sonhos se rasgaram!...
Caravelas doiradas a bailar...
Ai quem me dera as que eu deitei ao mar!
As que eu lancei a vida, e não voltaram!...”
(Caravelas / Florbela Espanca)
“...Todo o amor que nos prendera
Como se fora de cera
Se quebrava e desfazia
Ai, funesta primavera
Quem me dera, quem nos dera
Ter morrido nesse dia ...
Todo o amor que nos prendera
Se quebrara e desfizera
Em pavor se convertia
Ninguém fale em primavera
Quem me dera, quem nos dera
Ter morrido nesse dia...”
(Primavera / David Mourão-Ferreira)
Agora imagine esses versos soberbamente cantados por uma moça alta, do pescoço para baixo vestida à moda fadista com o mais tradicional vestido longo e xale negro. Do pescoço para cima um rosto que mais se imagina encontrar em uma rave ou em um festival techno... Dulce Pontes, fique com raiva não Neguinha, mas decisivamente quero o divórcio... Todas as peripécias eletrônicas COMPETETEMENTE (sejamos justos) inseridas no trabalho da Dulce Pontes, se apagam diante do poder acústico do trio que acompanha a Mariza. Um violão que, não bastasse a beleza da base do fado, ainda faz uma ou outra linha flamenca.Um baixolão super discreto background para uma guitarra lusitana BELISSIMAMENTE INDISCRETA a despejar trinados encaixados em tristes acordes menores. Amigo e amiga, creia-me: o prêmio da BBC foi pouco.
O fim do show “Mariza - Ao Vivo em Londres”... Depois de ver a diva quase chorar (e fazer chorar) interpretando “Primavera” (que ela, mastigando um inglês de banco-de-escola, diz ser seu fado predileto), nada se espera do restante do show simplesmente por acreditar não ser possível fazer nada melhor... O que poderia superar aquilo que desfilou ante olhos e ouvidos???? Então, ela se dirige ao publico... Vai encerrar o show com o mais tradicional dos fados. Vai cantar aquele que (palavras dela) mais traduz a “alma do povo português”:::: “Povo Que Lavas no Rio”... Pronto... Para mim só faltavam “as tábuas do meu caixão” se me permite Homero Homem o empréstimo desse pedacinho de “Povo Que Lavas no Rio”... E, segue a fadista, vai interpreta-lo da forma como se faz originalmente nas tabernas: ACÚSTICO, SEM MICROFONE.... Ela desce do palco e se dirige ao meio do público. Seu trio de apoio (violão, baixolão e guitarra lusitana) a segue. Se posicionam bem no centro do recinto, ali, na platéia. Tudinho desligado...Nada ploogado... Nada de fios e tomadas... Nada de efeitos...
E então, ainda soando os acordes introdutórios, emerge a voz grave, melancólica, sombria...
“Povo que lavas no rio
que talhas com teu machado
as tábuas do meu caixão..."
Acordei no hospital......................
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