quinta-feira, maio 06, 2010

trânsito

Nunca fui fanático por automóveis. Para mim é somente um instrumento que me carrega do ponto “a” ao “b” de forma lépida e confortável. Não perco sono nem sacrifico orçamentos no altar da vaidade, prenda a um deus de lata e rodas. Claro que se tem aqueles desejos, vontades e quereres que ocupam nossa atenção de forma fugaz, não chegando a se constituir em um sonho de consumo. É o caso do Land Rover. Bem que gostaria de ter um bichinho daqueles em minha garagem. Off road de personalidade, o Rover tradicional não é mais feio por falta de espaço. O Márcio Ramos, amigo de infância e hoje médico em Santa Catarina (além de jipeiro fanático), tem um desses, um Land Rover Defender. Veio de lá pra cá em janeiro com a família toda trepada no veículo. Depois de trinta anos sem contato, nos encontramos para o reveillon em uma tranqüila praia do Rio Grande do Norte. Na lateral do Defender, um adesivo do Schrek. Segundo a Gabi, filha do Márcio, o carro á igualzinho ao personagem da animação: grande, verde e feio. Pois bem. O mais perto que chego de uma fixação automobilística seria um desses à minha porta.
Por outro lado não tenho o menor interesse em pick ups. Quem tiver suas Hyluxes, Silverados e correlatos pode dormir tranqüilo, pois que, pelo que me toca, não “puxaria” um desses nem com uma faca ao pescoço. Infelizmente, são temas recorrentes das letras vagabundas daqueles forrozinhos de merda tidos por eletrônicos. Ficou coisa de noveau riche, quase triscando o brega Mas estou aberto à doações. Caso algum caridoso leitor ou leitora resolva presentear-me com um desses, aceito de lacrimosos olhos mal esperando a hora do generoso(a) dobrar a esquina para eu vendê-lo ( o veículo) e dar entrada no meu Rover.
As escuderias clássicas também me chamam atenção. Ferraris, Lamborghinis, Porsches, Maseratis e Alfa Romeos (pra citar alguns somente) me fazem romântico muita mais pelas lendas que cercam as griffes. Mas não me vejo dentro de uma Ferrari F430. Prefiro apreciar a imagem, o conceito que brota do juízo visionário dos seus designers. Esses carros foram feitos pra voar baixo atingindo velocidades alucinantes e com uma capacidade de aceleração de um jato (o Maserati Grand Turismo S acelera de 0 a 100 kms/h em 3,2 segundos). Como sou frouxo de dar nó quando o assunto é meter o pé no acelerador, ficaria ridículo um Porsche se mantendo sempre abaixo dos 100 km/h, em sua velocidade de cruzeiro. Não, não. Esses esportivos somente pra olhar ou apreciar nas telas de cinema.
A bem da verdade o que eu queria mesmo era um Abrams M1A2. Para os dias que correm e enfurnado no trânsito de Cajazeiras, o Abrams seria perfeito se visto meu atual estado de nervos. Reze fervorosamente pra não se deparar com alguma emergência, tendo que se deslocar rapidamente em busca de socorro exatamente na hora do rush e pelas vias centrais da cidade. Sim, pois que por aquelas artérias a soberania fica com os pesados... ou os muito leves. Os primeiros são caminhões e ônibus que estacionam onde, quando e como querem. Param na maior cara-de-pau para descarregar suas mercadorias como se a via pública fosse a garagem de uma transportadora. E nem gaste a paciência e a bateria do seu carro buzinando freneticamente. Desligado o motor e ligado os piscas, esqueça. Ele não sairá dali nem por ordem do Criador.
Já os “muito leves”, nossos garbosos motociclistas, são um primor de arrojo suicida. Acredito que seria de bom tom alguém explicar para os infantes em apreço que um semáforo tem função de certa utilidade e importância não se constituindo parte da ornamentação natalina. É que para a maioria dos que se movem escanchados em duas rodas motorizadas tanto faz o verde, o amarelo ou vermelho. No semáforo, todos dizem a mesma coisa: “passe e o resto que se lasque”. E então você começa a colecionar arranhões nas laterais do seu carrinho, retrovisores deslocados e freadas bruscas.
Até aqui tudo bem, dentro do vai mal. É que mesmo aos trancos e solavancos você ainda consegue se locomover... até dar de cara com a bunda de um pesado placidamente estacionado no meio da rua enquanto laboriosos e musculosos gajos descarregam volumes. Alguns ainda tem a ousadia de colocar cavaletes interrompendo a via. Pode? Um particular gerenciando a via pública E é aí onde entra o meu Abrams M1A2.
Pesando 69 toneladas, munido de um canhão de 120 milímetros e mais três metralhadoras (uma delas anti-aérea), o Abrams M1A2 é um primor de tanque de guerra, perfeito pra situação aqui exposta. Fico babando só de imaginar minha pessoa dentro de um desses, bem na hora em que, dobrando a esquina, dou de cara com a traseira de um caminhão plantada bem no meio da pista. Já me vejo buzinando... isso depois de proceder uma adaptação no belicoso veículo: ligar o botão da buzina diretamente no gatilho do canhão. Já pensou o deleite de pressionar a buzina e ao invés do melodioso “bi-biiiiiiiip” ouvir um retumbante “BUUUUMMM”? A via desobstruída, não seja por alguns fumegantes pedaços de metal espalhados pelo asfalto, o que nada atrapalharia já que o meu veiculo não tem pneus e sim esteiras de aço. Infelizmente não fazem consórcios desses bichinhos. Resta-me confiar em nossas autoridades de tráfego urbano para que se apiedem do quadro.

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