quarta-feira, abril 11, 2007

Semanário



- Alô...

- Finalmente te apanho... Cadê os textos?

- Olha, Tô escrevendo agorinha mesmo...

- Não me venha com essa... Viu o que você mandou pra redação nas últimas semanas? Pra não dizer que nada, tenho de engolir uma porção de textos antigos, já publicados...

- Mas veja...

- Mas veja você, ora bolas... Tá pensando que esse jornal é o quê? E o seu leitor? Os dois ou três descontados sua mãe? Já não basta o suplício de sua mal arrumada redação, agora vão ter de engolir “reprises”? Chega... Cadê os textos?

- E que ando meio sem assunto...

- Mas como sem assunto? Onde você tá morando? Em Marte? O mundo estourando, o país a catar soluções mal ajambradas e você me vem com essa de “sem assunto”?

- Pois é...

- Pois é nada. Além do quê cronista não precisa de assunto. Vocês pegam qualquer merda e fazem um catatau em cima dela... Se bem que você é exceção: pega uma merda e produz outra...

- Olha a ofensa... Será que nunca deu em você aquele branco de idéias? Lassidão mental e essas coisas...?

- Deixa de papo furado e manda o texto dessa semana... E manda um inédito... Nada de repetição...

- Manera, tá bom? Me dá mais um tempo... Uma folguinha...

- Não me venha com firulas. Vai ficar sem produzir até o Juízo Final? E quando o arsenal de crônicas antigas se esgotar, vai mandar o quê? As redações do ginasial? Manda um texto novo ou já sabe... Substituo sua coluna por algo mais interessante... Talvez um anuncio do Biotônico Fontoura... Pelo menos rende uns trocados pro jornal...

- Vamos fazer o seguinte, próxima semana...

- Próxima semana uma ova... Manda um texto estalando pra essa semana... Coisa nova, sem aquela data cretina no fim da coluna indicando republicação... Tá ouvindo, não tá? Acabaram as férias...

- Será que não dava...

- Não dava e não dá... Deixa de enrolada. Escreve sobre a Reforma da Previdência ou coisa parecida...

- Mas aí é que está... Só de pensar na dita Reforma fico todo arrepiado, quanto mais escrever sobre.

- Então faz uma crônica sobre “o não ter o que escrever” ou coisa que o valha...

- Também não dá... Já fiz isso uma vez. O título era “Anticrônica”, tá lembrado?

- Tô e não vou republicar essa também...

- Agora pegou mesmo...

- Eu não devia, mas vou te dar o mote: escreve sobre um mal-humorado chefe de redação que pressiona um cronista...

- Taí, taí... Caiu a ficha... Danado é como começar... Pegar o fio condutor e que são elas...

- Faz o seguinte: começa com um telefonema atendido. Algo do tipo “Alô...”

- Isso, isso... Deixa comigo. Próxima semana...

- Próxima semana a puta-que-o-pariu... Manda o texto ou já sabe: vai escrever obituário em um pasquim qualquer... Ponto final.


(crônica publicada originalmente em
maio de 2003, in Gazeta do Alto Piranhas)

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